Iniciativa pretende transformar a região em um "Vale do Silício Fluminense", com um polo regional de desenvolvimento de soluções tecnológicas
Reportagem especial da revista Carta da Indústria
Uma iniciativa sem fins lucrativos pretende transformar a Região Serrana do Rio de Janeiro em um “Vale do Silício Fluminense”, ou melhor, na Serra Carioca Tecnológica. A proposta é ousada e caminha com passos firmes. A meta para os próximos dois anos é de 30% de crescimento na geração de novos negócios, elevando o faturamento anual para R$ 715 milhões. A ideia também é aumentar de 170 para 180 o número de empreendimentos e criar mais 360 postos de trabalho, além dos 3.000 já existentes.
A bandeira é erguida pela Firjan, pelo Sindicato da Indústria Eletrônica, de Informática, de Telecomunicações, de Produção de Software, de Produção de Hardware, de Produção de Produtos Eletroeletrônicos e Componentes no Estado do Rio de Janeiro (Sinditec) e pela Serratec, associação que reúne empresas de tecnologia de Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo. O objetivo é favorecer o crescimento e o desenvolvimento sustentável do setor.
A confirmação do sucesso da iniciativa se dará com a formalização de um polo regional de desenvolvimento de soluções tecnológicas, envolvendo empresas de software, novas tecnologias, internet das coisas (IoT), Big Data e telecomunicações, além de projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I). Em 2018, esses setores movimentaram quase R$ 479 bilhões no país, ou aproximadamente 7% do PIB nacional.
Em 1998, com grande incentivo e apoio da Firjan, o movimento Petrópolis-Tecnópolis já pretendia trazer as indústrias do futuro para a Serra do Rio. Mas, apesar do grande esforço, a ideia não foi adiante devido ao pequeno volume de negócios à época. Para que a história não se repita, empresas e prefeituras das três cidades serranas contribuem para a criação de tecnopolos que, juntos, formarão o Parque Tecnológico da Serra.
Felipe Meier, presidente do Sinditec, garante que a região confirmará uma vocação descoberta há mais de 20 anos. “Há um potencial real para a criação de um polo de inovação e tecnologia na Serra do Rio, principalmente pelo valor agregado de produtos, pela qualidade das empresas e pelo número de estabelecimentos, que hoje só fica atrás da capital”, afirma.
Qualificação profissional
Para o empresário Marcelo Carius, líder do Serratec, o crescimento do setor necessita de três pilares: capacitação profissional; infraestrutura nas cidades, para diminuir os impactos com a chegada de novos empreendimentos; e geração de negócios. Segundo ele, a formação de mão de obra é a base do projeto. “Há uma carência mundial de profissionais especializados em soluções tecnológicas, e passamos o mesmo aqui. Logo, é preciso disponibilizar trabalhadores competentes para atender o déficit laboral que as companhias têm hoje e, futuramente, facilitar a chegada de novas empresas”, destaca.
Assim, qualificação se tornou a palavra de ordem entre os dirigentes do Serratec e, por isso, o grupo se debruça na criação de programas para aperfeiçoamento da mão de obra. Com a Firjan SENAI, governo do estado e prefeituras municipais como parceiros, um projeto de residência em software terá início ainda no segundo semestre deste ano, com a proposta de formar 144 novos profissionais para Petrópolis e outros 140 em Nova Friburgo e Teresópolis, a partir de 2020.
Na visão de Luiz Antônio Daud, diretor do Sinditec na região, a capacitação representará um grande diferencial competitivo para atração de novos empreendimentos. “Mão de obra qualificada sempre é um diferencial para criação de novas empresas. Portanto, ter profissionais capazes de atender as demandas desse novo mercado é um item valioso, que pesa na tomada de decisão das empresas sobre novos investimentos”, ressalta Daud.
Pioneiros na região
Ladmir Carvalho, fundador da quarta maior empresa de fornecimento de softwares do Brasil, a Alterdata, espera que a região possa se tornar um grande centro tecnológico brasileiro, como acontece com Recife, Florianópolis e São José dos Campos. “O profissional de TI não necessita estar ao lado do grande mercado consumidor, então o interior do país reúne condições para ter grandes centros de desenvolvimento, a exemplo do que ocorre nos países desenvolvidos”, defende ele, com conhecimento de causa. Situada em Teresópolis, a Alterdata é a maior empresa de software do estado do Rio, com 50 mil clientes espalhados pelo país. “Outras podem nascer e ter esse mesmo desempenho, e o Brasil inteiro é um mercado comprador em potencial”, completa.
Para ele, a Serra do Rio tem tudo para ser uma das estrelas do país em tecnologia, pois a interiorização das empresas vem acontecendo em função da busca por segurança e qualidade de vida para os trabalhadores e, ao mesmo tempo, pela proximidade de grandes centros universitários.
“O estado do Rio precisa ser o motor de criação de talentos: engenheiros, projetistas, programadores e outros. Mas quem comprará os produtos está em todo o Brasil e no mundo. Geração de mão de obra de qualidade é o aspecto em que o estado do Rio mais pode ajudar”, enfatiza Ladmir.
Segundo Carius, muitos empresários estão manifestando vontade de se mudar para a Região Serrana, o que é um sinal positivo de que o trabalho desenvolvido está dando resultados. “Precisamos evoluir ainda mais em profissionalização e infraestrutura para que esse processo de instalação de empresas seja natural e constante”, pontua.
A chegada de novas empresas passa pela criação de leis de incentivo locais, como a Lei da Inovação de Petrópolis. A ideia é reduzir a burocracia e facilitar o estabelecimento de empreendimentos do setor, estimulando o envolvimento com as universidades e criando um ambiente de troca de conhecimento.
Assim como Petrópolis, outras cidades se movimentam para a criação de polos locais. Em Teresópolis, a prefeitura negocia um local para concentrar empresas. Em Nova Friburgo, o Espaço Arp, que já abriga diversos empreendimentos, inclusive do setor de tecnologia, foi o escolhido. O ponto receberá um Centro de Desenvolvimento de Software, projeto da Alterdata, que expande seus negócios pela região.
A diferença entre o Movimento Petrópolis-Tecnópolis e a iniciativa atual está na forma como foram desenhados. “Num primeiro momento, o poder público tinha a responsabilidade de desenvolver políticas para o desenvolvimento do setor, e não deu certo. Hoje, prefeitura e governo do estado vêm a reboque das ações implementadas pelo grupo empresarial. Em vez de propor projetos, o poder público dá apoio estrutural e institucional”, explica Carius.
O Parque Tecnológico da Serra também se posicionará como um hub de projetos de inovação – espaço para amadurecimento de startups de base tecnológica e PD&I. “Hoje temos 18 empresas com 600 funcionários e clientes em mais de 30 países. É um grande potencial que temos. Em três ou quatro anos, poderemos ter a nossa Serra Carioca Tecnológica e nos orgulhar disso”, conclui.