A oitava edição do Festival Futuros Possíveis, na Casa Firjan, nesta quinta e sexta-feira, 23 e 24/10, traz o tema (re)encantar o futuro, e lança o estudo de Macrotendências 2026-2027, desenvolvido pelo Lab de Tendências da Firjan IEL. O estudo destaca as principais forças de transformação que devem impactar a sociedade e os negócios nos próximos anos. Também no primeiro dia, o evento recebeu o futurista Peter Bishop que falou sobre o papel do conhecimento e da imaginação em tempos de incertezas no mundo.
O Festival Futuros Possíveis é referência nacional por reunir especialistas do Brasil e do exterior em torno da reflexão sobre os múltiplos caminhos do amanhã. Durante dois dias o público conta com painéis, oficinas, experiências sensoriais e apresentações artísticas. Nesta edição há participação de nomes dos Estados Unidos, Inglaterra, Austrália e Colômbia.
Na abertura o presidente da Firjan, Luiz Césio Caetano, ressaltou que o festival tem se destacado por antecipar movimentos que, anos depois, se tornaram realidade. “Na primeira edição, apresentamos a tendência da carne cultivada em laboratório; hoje é uma realidade com grandes investimentos. E em 2022, discutimos Inteligência Artificial Generativa poucos dias antes do lançamento do ChatGPT pela OpenAI”, observou.
A programação foi organizada em três eixos temáticos — (re)encontrar sentidos, (re)humanizar relações e (re)configurar máquinas —, abordando temas que cruzam tecnologia, comportamento e negócios. “É uma verdadeira viagem ao futuro”, resumiu Caetano, anunciando o lançamento do estudo de Macrotendências 2026–2027, que mapeia os principais sinais e transformações esperados para os próximos dois anos. A publicação, lançada anualmente desde 2018, chega agora também em formato físico, atendendo a pedidos do público.
Na apresentação das Macrotendências 2026–2027, Carol Fernandes, coordenadora, e Isabela Petrosillo, pesquisadora, do Lab de Tendências Firjan IEL, destacaram as principais forças de transformação que devem impactar a sociedade e os negócios nos próximos anos. Segundo as pesquisadoras, o relatório deste ano identifica três grandes macrotendências que devem orientar o debate sobre tecnologia, trabalho e comportamento: Tecnocracia, Robotecnia e Sensorium.
Carol lembrou que o estudo tem como missão antecipar sinais emergentes e traduzir tendências globais em oportunidades e desafios para o setor produtivo. “Nosso papel é observar o mundo, identificar pistas de futuro e transformar essas observações em reflexões estratégicas. Não falamos de um futuro único, mas de futuros plurais, moldados por diferentes contextos e realidades”, destacou.
Tecnocracia, o poder da soberania digital, é a macrotendência que aponta para a consolidação de uma nova ordem global baseada no domínio tecnológico. Países e empresas disputam infraestrutura digital, chips, energia e dados como recursos estratégicos de soberania. “Estamos vendo uma reorganização geopolítica guiada por quem detém a tecnologia. O Vale do Silício deixou de ser apenas um símbolo da inovação e passou a ser também um eixo de poder global”, observou Isabela Petrosillo.
Foram citados exemplos de o avanço da computação quântica, a criação de protocolos internacionais de governança de dados e o aumento da demanda energética provocada pelo uso intensivo da inteligência artificial. “Empresas de tecnologia já firmam parcerias com fornecedoras de energia nuclear limpa para garantir funcionamento contínuo de seus data centers. Energia se tornou um ativo de poder”, acrescentou Carol.
A segunda macrotendência, chamada Robotecnia, aborda a convivência crescente entre humanos e máquinas e a reconfiguração do trabalho. A combinação entre inteligência artificial e robótica vem transformando fábricas, escritórios e até setores como saúde e logística. “As máquinas estão ganhando autonomia. Hoje já vemos robôs que trocam suas próprias baterias e laboratórios autônomos conduzindo mil experimentos por dia sem intervenção humana”, exemplificou Isabela.
Além da automação, o estudo aponta o impacto da demografia na economia. “Com o envelhecimento populacional e a escassez de mão de obra em vários países, há uma corrida por soluções automatizadas e também pela recapacitação de profissionais acima de 40 anos para funções tecnológicas”, explicou Carol Fernandes.
Acesse o Estudo Macrotendências 2026-2027
A terceira macrotendência, Sensorium, traz um contraponto mais humano ao avanço tecnológico. O conceito propõe repensar a relação entre pessoas e máquinas, reforçando dimensões como sentidos, linguagem, empatia e cuidado.
“A tecnologia está atravessando nosso imaginário e transformando a forma como nos comunicamos. Já vemos pessoas reproduzindo maneirismos de chatbots e convivendo com robôs no cotidiano. Precisamos refletir sobre como (re)humanizar essas interações”, afirmou Isabela.
Peter Bishop
O futurista norte-americano Peter Bishop, referência mundial em foresight estratégico e fundador da organização Teach the Future, falou sobre como criar estratégias em tempos de incerteza, convidou o público a repensar a forma como enxergamos o futuro e tomamos decisões diante da crescente complexidade do mundo contemporâneo.
“Não podemos apenas prever o futuro — precisamos nos preparar para criá-lo”, afirmou o especialista, destacando que o pensamento estratégico deve combinar conhecimento científico e imaginação criativa. Segundo ele, as organizações e lideranças do século XXI precisam adotar uma mentalidade aberta à experimentação e à construção de múltiplos cenários, em vez de buscar certezas absolutas.
Bishop, que dedicou décadas ao ensino de estudos do futuro em universidades dos Estados Unidos e na formação de líderes empresariais, defendeu que o aprendizado sobre o futuro deve começar ainda na escola. “Ensinar o futuro é ensinar a pensar em possibilidades. É dar às pessoas a capacidade de enxergar alternativas e agir para transformar o que está por vir”, disse.
Durante a apresentação, o palestrante estrangeiro também enfatizou que momentos de crise — política, ambiental, social ou tecnológica — não devem ser encarados apenas como ameaças, mas como chamados à ação coletiva e à inovação. “Vivemos um tempo em que muitos esperam que algo aconteça. Mas o futuro não acontece conosco; nós é que fazemos o futuro acontecer”, provocou.
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| O futurista norte-americano Peter Bishop | Foto: Vinícius Magalhães |
O evento trouxe ainda no primeiro dia a neurocientista Natalia Mota que falou sobre como o cérebro é capaz de criar novas formas de pensar, sentir e se conectar, mesmo em tempos de instabilidade. Ela explorou descobertas recentes sobre linguagem, saúde mental e criatividade, reforçando o papel da esperança como força de transformação.
No painel “Inovação, dados e poder: a nova ordem global”, Tanguy Baghdadi, Claudia Trevisan e Diogo Cortiz, com mediação de Giorgio Rossi (Firjan Internacional), discutiram os impactos da corrida tecnológica na geopolítica e nas relações internacionais. Os especialistas apontaram oportunidades para o Brasil se posicionar estrategicamente em temas como energia, dados e inovação.
A futurista Clarice Carvalho Garcia defendeu, na palestra “Imaginação e colaboração para futuros regenerativos”, o uso do foresight estratégico como ferramenta para transformar crises em oportunidades. Ela propôs uma visão que une pensamento sistêmico, criatividade e ação prática diante da era das “policrises”.
O painel “Robôs, hiper digitalização e a próxima era da indústria”, com Alexandre Brincalepe Campos, Robson dos Santos e Luiz Gustavo Maria, mediado por Denisson Brito (Casa Firjan), apresentou a nova geração de robôs inteligentes e colaborativos, destacando seu papel na construção de uma indústria mais flexível e sustentável.
O pesquisador Rodrigo Bastidas sustentou que a ficção científica funciona como um laboratório de utopias sociais e tecnológicas, transformando a imaginação em ferramenta de mudança.
Uma perspectiva do Sul Global foi apresentada pelo professor Fabrício Pereira (Unirio), que destacou filosofias como o Bem Viver andino e o ubuntu africano como alternativas às lógicas individualistas da modernidade.
Encerrando o dia, o biólogo evolucionista Rob Brooks, autor de Artificial Intimacy, abordou os limites éticos e emocionais das relações entre humanos e máquinas, refletindo sobre o impacto da empatia simulada na identidade e nas conexões humanas.
As oficinas também tiveram destaque: LEGO® Serious Play®: Mãos que criam o futuro, com Naraiana Costa, que convidou os participantes a transformar incertezas em protótipos de futuros éticos e criativos; Planejando uma Cidade Humana, Inteligente e Sustentável, com Regiane Relva Romano e a equipe do Senseable Lab do MIT, estimulou soluções para políticas urbanas mais integradas; e (Re)encantar o olhar para a tecnologia, realizada no FabLab Casa Firjan, incentivou o uso da fabricação digital como meio de despertar curiosidade e imaginação.